26 de mai. de 2015

Qualquer dor vira texto

Primeiro texto do ano pra Confeitaria, curtinho e intenso, rs. Lê lá :)))

http://confeitariamag.com/janbitencourt/parecia-real/


PARECIA REAL

Não é justo que a paixão acabe antes, somente para um dos lados.
Foram apenas três luas cheias juntos.
Sobrou o sabonete líquido que prometia oitenta banhos.
Mas nada dura tanto hoje em dia, não é?
Enquanto você volta a pescar mulher no Tinder,
me volta a lembrança da gente dançando uma música lenta na farmácia.
Como eu estava bonita no jantar de Carnaval, através dos seus olhos preocupados.
Da dificuldade de ficar 72 horas sem tomar vinho com você pro exame de sangue.
Compartilhamos sardas, dragões chineses e dentes que quebram de tanto ranger.
Como impedir os pensamentos de voltarem para trás, a cada vez que pego a estrada?
Você prometeu não me machucar, se eu não pedisse.
Mas saiu para caçar problemas e voltou cheio deles.
Agora ainda sobram cortes pra cicatrizar.
Acho que machucou mais saber que você não se importa.
Vai passar. Só não sei ainda acender um cigarro noutro, como você.
Sei, sim, ver o lado cheio do copo de Negroni.
E já ando gostando de voltar a usar salto alto.

15 de fev. de 2015

Conto curto que vai virar curta.

Em dezembro participei da coletânea "Incubadora de Serpentes" com um pessoal querido que conheci fazendo a oficina do Ronaldo Bressane no Hussardos Clube Literário. Se você não conseguiu ir ao lançamento, dá pra ler o conto aqui embaixo. Dá também pra torcer pra ele virar um curta, meu próximo projeto, depois que terminar finalmente o segundo romance :)))

Dói não.

A maior ladeira do bairro era a da Rua Trabulsi. Maior ainda quando você tem 12 anos e está agarrada na garupa do Ricardinho, numa mobilete Caloi velha.
Nem se falava em capacete nos anos 80. A gente dançava punk rock com tênis de skatista feito menino, bebia keep cooler e assava batatas na ruinha que tinha em frente ao prédio. Nem por isso viramos um bando de bêbados e maloqueiros. Hoje, quase todo mundo tem um emprego normal, vidinha besta e financeiramente estável, sonho de todo pai. Menos o Ricardinho.
Enquanto todos os meninos da nossa idade eram baixos e extremamente magros, ele era mais gordinho e charmoso por conta de uns olhos verdes enormes e uma melancolia já quase adulta. Usava aparelho nos dentes, estudava no mesmo colégio de padres que eu e diziam que seu pai era dono do maior motel de São Paulo. Não era bom aluno, mas era descolado. O avesso de mim, filha de bancário e dona de casa, que usava óculos e vivia de blusão amarrado na cintura.
Tinha muita menina bonita na nossa turma. Mas de vez em quando era eu que ele chamava pra descer a Trabulsi. Caxias que sou, me borrava de medo mas não perdia uma oportunidade. A gente ia conversando no caminho, a 10 por hora e eu tentava me controlar pra que minha voz não denunciasse a tremedeira.
Lá no topo ele me olhava bem de perto e perguntava se tava tudo bem, rindo e pedindo pra eu segurar firme. E eu aproveitava pra segurar mesmo. Um dia até cravei as unhas na cintura dele sem querer. “Dói não”, ele disse sorrindo.
Não sei o quanto durava a descida, mas tenho cada segundo desses colados em mim, mesmo 20 anos depois. O vento batia na cara e, junto com a adrenalina, trazia o cheiro de perfume fresco de homem, carregado de hormônios adolescentes, desses poderosíssimos. Às vezes descíamos duas ou três vezes seguidas a ladeira e voltávamos felizes e suados, com o coração à toda.
Num dia dos namorados ele tocou a campainha do meu apartamento com uma flor nas mãos, dessas compradas, não arrancadas. Me deu uma idiotice tão grande que agradeci e taquei a porta na cara dele. Ele só podia estar de brincadeira comigo.
E foi assim, desatenta, que aprendi que a vida escorre da gente e despenca ladeira abaixo.
No final de semana seguinte, Ricardinho sofreu um acidente de carro fatal voltando da balada com uns amigos do irmão mais velho, provavelmente bêbados. Não agüentei ir ao enterro, tirei a minha primeira nota vermelha no boletim e tive que vender a mobilete.

26 de set. de 2014

Nova edição do Amor

Essa já é a terceira edição da coletânea Amor e agora também pode ser comprada na loja on line da Confeitaria junto com outros livros bacanas (Versão Beta e Contos Mínimos entre eles <3), ilustrações, acessórios e achados incríveis. Corre lá :))) http://loja.confeitariamag.com



10 de mar. de 2014

3864 3992 - Taxi.

É o fim. Não do ano, nem de um relacionamento. É o fim de uma era. Foram 10 anos morando no interior e o equivalente contemporâneo às 10 pragas do Egito como prova para voltar à cidade que me viu crescer.
Enfrentei a ira da minha mãe, que foi contra a mudança desde o inicio (e ainda nem veio me visitar), como se eu estivesse levando seu neto para um campo de concentração. Depois perdi minha empregada, que estava há 8 anos comigo e que era mais essencial do que um marido na minha rotina com um filho pequeno. Mesmo assim, agendei a mudança e desencaixotei sozinha 25 volumes de 1m X 1m ganhando uma hérnia para a minha coleção de dores na lombar. Em seguida veio uma enxurrada de pulgas e pernilongos que me deixou com canela alérgica cheia de cascas de ferida. Mas ferida boa é a que aparece na cara da gente, então fui correr pelo bairro e ralei o nariz e os joelhos na calçada em frente à escola do meu filho. A casa também já alagou com a chuva por conta de uma calha furada, o portão elétrico quebrou e o carro já morreu de manhã com os bicos injetores entupidos. Para terminar, peguei uma gripe com direito a febre e calafrios.
Mas é véspera de carnaval. E meu último sobrenome é o nome de um santo guerreiro (não uso e não digo, adivinhe aí). Então me enchi de remédios e fui descobrir o Parque Villa Lobos. Depois encontrei uma amiga querida e andamos a pé pela Augusta, esbarramos noutro amigo querido (e apaixonado por essa cidade) passeando de bicicleta e seguimos um bloquinho na Vila até chover de ficar ensopada. Não achei um táxi, mas achei que estava perto pra andar na chuva. E o texto foi me levando pelos quilômetros que o Google disse que andei. Descobri que a Natingui tem um trecho grande de subida, agravado talvez pelas 3 cervejas, (4? 5?) e pela congestão nasal.
Em 20 dias, deixei pegadas e sardas pela calçada do meu bairro. Mas agora decorei o telefone do ponto de taxi mais perto. Quem sabe da próxima vez eu ligo?

24 de jan. de 2014

Virei Confeiteira! Texto 30 Verões de Distância.

Essa semana virei autora oficial da Confeitaria, um site incrível que eu já participava como convidada. Muito amor por esse time talentoso e pela editora mais fofa do planeta, Fabi Secches <3. Olhem só como ficou linda minha bio lá:

http://confeitariamag.com/author/janbitencourt/

Aqui está mais um texto que foi pra lá:



30 VERÕES DE DISTÂNCIA


Uma picada de pernilongo num dia em que faz 30 graus.
“Mãe, tá coçando, tá coçando, tá coçaaaaando!”
Juqueí não existe mais sem o H e o Y. Nem meu filtro solar da época, o Eversun FSP 4, passado com a mão pesada da minha mãe, sobre as costas já ardidas.
O verão de 84 tinha cheiro de suor doce, creme protetor e um álcool canforado que usávamos para aliviar a coceira. Eu não tinha mais do que meia dúzia de sardas, mas as canelas já eram grossas e viviam arranhadas: “Não coça com a unha, menina!”
Dava pra identificar o inseto de acordo com o aspecto da alergia. Geralmente, eram os borrachudos que picavam ardido, coçava muito e deixavam apenas um pontinho vermelho na pele, que era espremido com as pequenas unhas dos dedões para que saísse um caldinho de sangue e, depois, um caldinho do “veneno” do bicho. Essa operação complexa e terapêutica aliviava um pouco, quando não machucava mais e formava casquinhas que, por mais arrancadas que fossem, insistiam em se refazer até que parássemos de prestar atenção nelas. As minhas eram campeãs em se formar novamente e rápido.
“Sangue doce”, dizia minha mãe.
Haviam feridas raras, que formavam pequenas bolhas d’água, deliciosas de estourar, mas que ardiam muito e não coçavam tanto. Diziam que era de aranha, mas nossas teorias da conspiração também consideravam ser uma reação a formigas famintas, xixi de sapo ou lambida de barata.
Uma vez, consegui cruzar a trajetória de uma abelha e continuei correndo com o rosto em chamas. Passado o susto, sobrou um inchaço tão grande, que me perguntaram se era caxumba.
Nossa casa tinha muretas no lugar das paredes internas (falta de dinheiro ou tendência?). Nelas, a gente deitava para esfriar as costas, no limite entre tombar para algum dos lados. Uma vez, por falta de forro no telhado, um morcego caiu do teto no peito de uma tia sonolenta. Meu pai e meu tio mergulhavam para pegar lagostas e robalos até “estourarem os ouvidos”. E, de vez em quando, levavam as crianças (eu, meu irmão e minha prima) para pescar porquinho num barco de alumínio laranja, que tinha só dois metros de comprimento. Voltávamos com as coxas e costas vermelhas, em cima do descascado.
“Por que não botaram camisetas nas crianças?”
Tínhamos um Opala marrom e vínhamos atolando pela praia, porque a estrada ainda não chegava até lá. À noite, conseguíamos ouvir umas seis espécies de sapos e enxergar vagalumes. O único livro da casa era “O Menino do Dedo Verde” e, mesmo com umas vinte páginas faltando, ainda nos atraía, verão após verão. A TV pegava raramente à custa de uma antena antiga e bombril. O tempo passava lento, andávamos um quilômetro a pé no sol quente para chegar à praia e tínhamos um gato hiperativo chamado Pingo. Nossos amigos eram caiçaras, participávamos de gincanas para limpar a praia e comíamos lambe-lambe (arroz com mariscos) na casa de um amigo pescador do meu pai, que um dia arpoou um tubarão e fez uma peixada pra toda a cidade.
Insetos, peixes, aracnídeos, crustáceos e anfíbios que hoje soam estranhos para a molecada. Bichos que eles só vêem nos livros de ciências ou dentro de algum aquário de ecoresort nas férias, entre as aulas de axé da piscina e as atividades do Kids Club. O sol mudou muito nesse tempo também. Talvez só as picadas ainda cocem como antes.

* Imagem: Pia Bramley.

Outro motivo de comemoração é o Livro "Amor | Pequenas Histórias" que está saindo do forno e reúne 60 autores e ilustradores da Confeitaria (e do qual participo com um continho inédito). O lançamento está marcado para dia 14/02 e promete. No instagram já tem até pré-venda pros mais ansiosos. Link pro evento no face abaixo:

https://www.facebook.com/events/287148568105671/?ref_dashboard_filter=upcoming

10 de jan. de 2014

"O coração, se pudesse pensar, pararia." (F. Pessoa)

Meu 2014 começou feliz demais. Agora faço parte de um time incrível vinculado à Escola de Escrita Online de Portugal e ofereço meu Curso de Contos à distância. Saiba mais no link e compartilhe com quem você sabe que ama escrever :)))

http://escritacriativaonline.net/brasil/


Aproveito pra deixar aqui arquivada uma entrevista que dei em setembro sobre o livro e que anda inspirando mais publicitários a fugirem pra literatura, rs. Feliz 2014 pra nós todos!

http://tvuol.uol.com.br/assistir.htm?video=versao-beta--jan-bitencourt-0402CD183760E4B14326